Talita Seniuk

 A INFLUÊNCIA ORIENTAL NA CULTURA RUSSA


Este trabalho busca apresentar alguns elementos orientais, em especial os mongóis, enraizados e naturalizados na cultura russa, imperceptíveis aos olhos menos atentos. Estrutura-se em três tópicos, A Rússia, Império Mongol e As Influências, respectivamente. Como referenciais utilizam-se Ferro [1990], Figes [2017], Mason [2017] e Segrillo [2012], o primeiro ao apresentar um conceito sociológico relativo à fusão cultural e estes últimos três apresentam com maestria diversos elementos culturais desse país de extensões transcontinentais que por vezes se vê como europeu, outras como asiático e ainda, como euroasiático. Vale ressaltar que essa influência não se encerra na discussão proposta, extrapolando os limites aqui impostos devido a sua riqueza cultural.

 

A Rússia

A história da Rússia é marcada por ondas migratórias, guerras, invasões, anexações de territórios entre outros fatores que lhe afetam desde os primórdios da humanidade. Tudo isso a conferiu um status de melting-pot [local onde se derrete e funde o metal], emprestando o termo de Marc Ferro [1990], ao agrupar pessoas com diferentes modos de vida, culturas, religiões e grupos étnicos em oposição ao salad-bowl [tigela de salada, salada mista] do mesmo teórico, em que as culturas conservam suas identidades em separado. Como parte de seus limites terrestres permeiam dois continentes, as origens de seu povo também abarcam influências de ambos, como exemplo, muitas famílias russas tinham/tem ancestrais asiáticos, como dissera Napoleão Bonaparte certa vez: “Raspe um russo e encontrará um tártaro”.

As origens da Rússia contemporânea não podem ser encontradas em seu território e nação atuais, mas na sua vizinha Ucrânia. Foi o Estado Kievano - também chamado de Rus’ - existente entre os séculos IX ao XIII que compreendia diversas cidades-Estado descentralizadas compostas entre os povos eslavos orientais, os grão-russos [russos], os pequeno-russos [ucranianos] e os russos brancos [bielo-russos] [SEGRILLO, 2012] que delinearam os contornos atuais. 

Devido à vassalagem em relação ao Grande Príncipe de Kiev e até mesmo pelas suas características descentralizadas, esses reinos não foram capazes de frear as invasões mongóis vindas do Oriente e que se estenderam entre os séculos XIII ao XV. Essa investida asiática dispersou os povos eslavos, marcando-lhes a partir desse momento como povos separados [SEGRILLO, 2012]. Só no século XV Moscou consegue unificar novamente esses povos e se livrar da dominação mongol.

Contemporaneamente, a Rússia é o maior país da Europa e da Ásia ao mesmo tempo, considerando que seu território ocupa porções nos dois continentes, sendo dividida nesse sentido pelos Montes Urais; fato este que causa discussões acaloradas sobre sua localização, se é europeia, asiática, as duas [eurasiana] ou ainda, uma nação singular que apresenta aspectos únicos [SEGRILLO, 2012].


Império Mongol

Temujin como seu nome verdadeiro ou mais conhecido como Genghis Khan foi o responsável pelo maior império que já existiu [cinco vezes maior que o Império Romano no seu ápice], fundando-o ao unir todas as tribos mongóis em 1.206 [MASON, 2017]. A extensão territorial conquistada por ele e seu povo atingiu entre 21 milhões de km2 segundo Mason [2017] e 33 milhões de km2 segundo Segrillo [2012] e abarcava as terras entre a Polônia e a Coreia, da Sibéria ao Vietnã, incluindo a China também por um século. 

Os mongóis foram exímios guerreiros, que montados a cavalo ditavam ataques velozes e ferozes sobre seus inimigos, utilizando-se para isso de técnicas de cerco e de aniquilamento sofisticadas [SEGRILLO, 2012] com uso de catapultas e foguetes [copiadas da China]. São conhecidos pela crueldade com que tratavam seus inimigos, utilizando-se de forma bem sucedida o terror sistemático como forma de submissão, poupando os rendidos e aplicando a tática de terra arrasada para os que não se subjugavam.

Entretanto, não se tratavam apenas de selvagens nômades, porque selecionavam o que lhes interessava nos povos e regiões conquistadas, agregando conhecimentos e tecnologias, alcançando uma administração burocrática eficiente já naquele momento e que abarcou um milhão de pessoas [SEGRILLO, 2012].

Vale a pena ressaltar que apesar de exigirem tributos e soldados por parte de seus conquistados, além de fidelidade política, no que tange questões socioculturais como religião, lideranças locais e tradições, os povos tinham plena liberdade de mantê-las sem sofrer interferências [SEGRILLO, 2012]. Mesmo que não houvesse essa obrigatoriedade de seguir costumes e hábitos mongóis, essas comunidades mantiveram sua cultura agregando elementos de seus dominantes.

Para Segrillo [2012], há a necessidade de pontuar se foi o jugo mongol de dois séculos sobre a Rússia e nações circundantes que impediu sua efetiva participação na Renascença e consequentemente o usufruto dos bens produzidos pelo Ocidente no Medievo, ou seriam outros motivos que teriam causado sua “estagnação”, estereótipo consolidado sobre o período nos livros de História.

Para o mesmo autor, ao contrário do que se vê referenciado sobre a temática, foram os mongóis que contribuíram com a união dos povos eslavos ao impor um domínio unificado de séculos e que quando da sua expulsão em 1.480, o futuro Império Moscovita herdou um império eslavo unido, pois estes se valeram em relação aos outros antigos reinados colaborando com os conquistadores, o que lhes rendeu sua hegemonia sobre os demais.


As influências

Como resultado de relações administrativas amistosas entre os “russos” e os mongóis temos até hoje o uso das palavras tesoureiro [казначей – kaznachei] e tesouro [казна – kazna] [SEGRILLO, 2012]. No vocabulário cotidiano há inúmeras outras, em especial, como cavalo [лошадь – loshad], bazar [Базар – bazar], celeiro [амбар – âmbar], cofre [сундук - sunduk]; o próprio Gêngis Khan foi chamado de Gêngis Tzar [царь] durante algum tempo; além desses verbetes, há também expressões turcomanas como Vamos embora [Давай поідим - davai poidem], Vamos sentar [Давай посидим - davai possidim] e Vamos embebedar [Давай попим - davai popem] [FIGES, 2017]. Esse uso do verbo “vamos” - em russo  Давай - que cunhou diversas expressões também se percebe na Ucrânia com uma pequena variação para Давайте, utilizados até hoje.

Segundo Figes [2017] havia quatro linhagens mongóis principais de que descendiam todos os russos: os nômades de língua turcomana que acompanharam Gêngis Khan no século XIII e se fixaram na Rússia depois da desestruturação da Horda Dourada como os Karamzin, Turgueniev e Rimski-Korsakov; turcomanos que foram para lá através do Ocidente como os Rachmaninoff; famílias mistas de origem eslava e tártara como os Sheremetev, Stroganov e Gogol; e ainda, famílias russas que alteraram seus sobrenomes visando relações mais amistosas com as tribos nativas e para soar mais turcomano por terem se casado com outras tártaras, como os Veliaminov que se tornaram Aksakov. Nesse sentido: “Eram europeus ou asiáticos? Eram súditos do tzar ou descendentes de Gêngis Khan?” [FIGES, 2017, p. 251]. 

Toda essa relação de reconhecimento e proximidade com as origens orientais se consolidou entre os séculos XV e XVII, finalizando com o czarismo de Pedro I que iniciou uma onda de transformações sociais e culturais na Rússia, desejando aproximá-la do restante da Europa, que culminou, por exemplo, com a construção da cidade de São Petersburgo, cujos elementos arquitetônicos foram levados da Europa, mas com um viés místico próprio russo e que fora o palco cultural dos escritores dos 1800 como Dostoievski, Chekov, Tolstoi, Gogol, Pushkin e de inúmeros outros.

Entretanto, muitos dos que escolheram viver lá não abandonaram seus costumes antigos, pois abaixo do sonho europeu ainda se via a velha Rússia [FIGES, 2017]. Para o tzar a Rússia sempre fora vista pelos europeus como um elemento estrangeiro que não pertencia ao que se denominava como Velho Mundo, sendo reconhecidos como asiáticos no Ocidente e europeus frente aos asiáticos [FIGES, 2017] e em seu governo, enquanto o Império Russo se expandia pela Ásia, houve inúmeras discussões acaloradas sobre as heranças asiáticas entre aqueles que aceitavam com orgulho sua ascendência oriental e aqueles que a desprezavam, considerando uma traição tal incitação. Frente a esse embate, o próprio Dostoievski escreve num dos seus textos:


“A Rússia não está só na Europa, mas na Ásia também [...] Devemos pôr de lado o nosso temor servil de que a Europa nos chame de bárbaros asiáticos e dizer que somos mais asiáticos do que europeus [...] Essa noção errônea de nós mesmos como exclusivamente europeus e não asiáticos [e nunca deixamos de ser estes últimos] [...] nos custou muito caro nesses dois séculos, e pagamos por ela com a perda da nossa independência espiritual [...] Para nós é difícil virar as costas à janela que dá para a Europa; mas essa é uma questão do nosso destino [...]” [DOSTOIEVSKI citado por FIGES, 2017, p. 284].

 

Outro intelectual, Nicolai Gogol, por exemplo, ucraniano, considerado como escritor russo devido às posses dos territórios do Império Russo na época de seu nascimento possuía descendência com os Gogel turcomanos. E muitos brasões de famílias nobres russas possuíam elementos muçulmanos como sabres, flechas, luas crescentes e a estrela de oito pontas [FIGES, 2017] que confirmam essa ascendência.  

Tratando-se de costumes russos herdados dos cãs mongóis temos a superstição sobre a soleira da porta, onde não se deve pisar e nem cumprimentar ninguém através dela; há ainda uma homenagem originada com esses guerreiros que se faz jogando alguém para cima para brindar um momento de felicidade, inclusive sendo representada numa das passagens das obras do escritor Nabokov [FIGES, 2017].

No quesito religioso-pagão, práticas xamânicas e uso de totens em rituais camponeses, amuletos, superstições, tudo isso fazia parte do imaginário social e ainda está presente, principalmente nas áreas rurais. Entre os objetos sagrados utilizados pelos xamãs buriatos, por exemplo, existe a figura do cavalo, que é representada por um pedaço de pau similar a um cajado, que acompanha a dança xamânica e na parte superior representa a cabeça do animal e na outra extremidade seus cascos, tendo esses formatos; durante o êxtase a parte inferior é batida no chão como se os cascos tocassem o solo durante uma cavalgada, o cavalo de pau é o veículo que leva o líder religioso ao mundo dos espíritos nas sessões. Já nas tribos fino-úgricas o tambor do xamã era chamado de cavalo, possuía rédeas e a baqueta era chamada de chicote, pois o açoite dava o ritmo, similar ao efeito sob o animal [FIGES, 2017].

O cavalo de pau ou de palha era o brinquedo por excelência das crianças camponesas russas até o século XX, mas ao contrário do que se percebe no Ocidente onde o objeto pode ser deixado no quarto delas, na Rússia, ele não era bem vindo dentro de casa. O equino tem um símbolo especial, é o legado asiático no país [FIGES, 2017]. Pushkin fala deles num poema, Blok e Briussov retratam-nos em suas obras literárias também. Os cavalos representam os mongóis que chegavam das estepes.

Os Loucos Santos, entre eles Rasputin o mais famoso, igualmente derivam da cultura oriental, de perambulação religiosa, com poderes curativos e suas próprias profecias [FIGES, 2017]. Esses personagens itinerantes vagavam pelas aldeias, com roupas diferentes, sendo alimentados pelos camponeses e famílias aristocratas que acreditavam em suas adivinhações. O próprio Tolstoi descreveu que sua família contava com os serviços de um deles. Pushkin, Mussorgski e Dostoievski deram atenção em suas obras para esses personagens bastante comuns do período. Havia várias leituras sobre essas pessoas que vagavam e recebiam esmolas.

No artesanato, a famosa boneca chamada de матрешка ou матриоска -matrioshka ou erroneamente de бабушка - babushka [babushkas são as idosas que usam lenço na cabeça, geralmente representam avós] não tem origem nesse país. Seu conceito foi trazido do Japão das bonecas de encaixe; só apareceram na Rússia em 1891 devido a uma encomenda da riquíssima família Mamontov para o artesão de brinquedos Maliutin [FIGES, 2017]. No final dessa década tornaram-se populares como representantes da cultura russa sem ser.

A indumentária vasta, até meados do século XX, também abarcava elementos asiáticos expressos nos nomes das peças e nos seus modelos, como um casaco leve [kaftan/zipun - кафтан/зипун] e um casaco grosso [armiak – армиак]; o gorro que era considerado a coroa do tzar, segundo uma lenda, era tártaro [FIGES, 2017]. Muitas gravuras que remetem à obra Taras Bulba de Gogol, onde conta a história de uma família cossaca, podem ser vistos modelos de vestuários em questão.

Os próprios regimentos cossacos tão presentes nas histórias possuem características semi-asiáticas. Viviam nas fronteiras sul e leste, no Cáucaso e na Sibéria, governados por um líder mais velho; eram ferozes, defendiam sua liberdade, ao passo que eram prestativos para alguns assuntos. A palavra cossaco [em russo Казак – kazak] deriva do turcomano e significa cavaleiro. Pushkin e Tolstoi reafirmavam essa tendência, Gogol descreve-lhes num texto:


“Os cossacos são um povo que pertence à Europa na fé e na localização, mas ao mesmo tempo é totalmente asiático no modo de vida, nos costumes e vestimenta. São um povo em que duas partes opostas do mundo, dois espíritos opostos estranhamente se reuniram: prudência europeia e abandono asiático; simplicidade e esperteza; uma forte noção de atividade e amor ao ócio; um impulso para o desenvolvimento e a perfeição e, ao mesmo tempo, um desejo de parecer desdenhoso de toda perfeição” [GOGOL citado por FIGES, 2017, p. 266].

 

No que tange a culinária, arroz, macarrão, ricota e seu preparo também remetem ao Oriente; carne de cavalo e leite de égua remetem as tribos mongóis. Foi só no século XIX que o Ocidente descobre essas particularidades em relação aos equinos fazerem parte da dieta dos russos, o que causa estranheza e taxa-lhes de bárbaros [FIGES, 2017]. 

No folclore russo, em especial lendas e mitos, muitos só puderam ser compreendidos como derivados do Oriente. Seja pelas diferentes trocas culturais ou mercantis, apareceram diversos indícios desse empréstimo cultural para a composição do patrimônio russo. A lenda de Sadko que trata de um mercador em busca de riqueza num reino submerso procede da história brâmane do Harivamsha; e a história de Ilia Muromets, um herói com traços tártaros e descendente de reis míticos da Índia [FIGES, 2017]. A base da maioria dos contos se dá nas estepes asiáticas e não nas paisagens genuinamente tidas como russas.

Questões culturais são difíceis de isolar e limitar suas fronteiras pela fluidez com que transitam nas relações sociais, ainda mais num país com território continental como a Rússia. Apesar de debates acalorados que se iniciaram ainda no reinado de Pedro I e que se estendem até os dias de hoje sobre as influências orientais na cultura nacional, valemo-nos das palavras de um pintor russo, Shevchenko, que no governo do referido tzar afirmava que os diferentes matizes - europeu/russo e asiático/oriental - eram um neoprimitivismo singular dessa nação [FIGES, 2017] cuja característica principal era que não se permitia estabelecer um limite: 

“A Rússia e o Oriente têm se interligado de forma indissolúvel desde as invasões tártaras, e o espírito dos tártaros, do Oriente, se enraizou a tal ponto na nossa vida que às vezes é difícil distinguir onde termina uma característica nacional e onde começa uma influência oriental [...]” [SHEVCHENKO citado por FIGES, 2017, p. 292].

Embora as sementes do que compreendia ser russo terem brotado durante a mocidade de Pedro I através de suas viagens pela Europa com o intuito de buscar referenciais que pudessem ser aplicados na Rússia para torna-la um Estado Moderno, trazendo discussões de que elementos faziam parte dessa identidade, o paradigma se estende até hoje. Como detestava Moscou que era uma civilização totalmente religiosa, ligada a Bizâncio, considerando-a como um antro de cultura arcaica e provinciana, que ainda vivia no Medievo, decidiu construir uma nova capital para seu império, uma cidade que forçasse os russos a adotar um estilo de vida europeu [FIGES, 2017]. Não que os russos não tivessem uma identidade cultural e social que lhes reafirmasse enquanto uma etnia com suas próprias especificidades, mas devido ao seu território continental havia muito a se considerar.

No século XIX, a necessidade de construção de uma consciência nacional vai desencadear uma busca por essa essência, colocando em oposição três elementos: Moscou dos eslavófilos, religiosa e camponesa como representante da verdadeira tradição russa; São Petersburgo, símbolo iluminista e de progresso com bases europeias; e a visão dos citas que a viam como base cultural da estepe asiática: “[...] que varreria o peso morto da civilização europeia e criaria uma nova cultura na qual homem e natureza, arte e vida, fossem um só. Esses mitos eram mais do que apenas “construções” de uma identidade nacional” [FIGES, 2017, p. 16]. Nesse mesmo século o Império Russo se expandia na estepe asiática e aceitou uma política de adotar as suas culturas como parte de uma cultura maior, nacional.

 

Considerações

Os inúmeros elementos apresentados que compõe a riqueza do patrimônio cultural russo em seus mais variados segmentos - vocabulário, indumentária, culinária, lendas, mitos, folclore, histórias, rituais religiosos, literatura, personagens históricos, brinquedos, costumes, genealogia, entre outros - são algumas das influências orientais que essa nação e áreas circundantes receberam há séculos devido as constantes ondas migratórias e momentos de domínio estrangeiro. Durante muitos anos emerge o debate e o conflito em torno de um grupo que soma esforços para se aproximar da Europa em oposição àquele que busca suas raízes asiáticas; discussão essa iniciada no governo de Pedro I e que se digladiam, pelo menos no campo intelectual até a contemporaneidade. A lição que fica é que o modus operandi da cultura russa se utiliza de artefatos orientais.

 

Referências

Talita Seniuk é licenciada em História pela Universidade Estadual de Ponta Grossa, em Ciências Sociais pela Universidade Metodista de São Paulo e em Filosofia pela Universidade Metropolitana de Santos; pós-graduada em Metodologia do Ensino de História e Geografia pelo Centro Universitário de Maringá e em Ensino de Sociologia pela Universidade Cândido Mendes. Coautora do livro As Ucrânias do Brasil: 130 anos de cultura e tradição ucraniana pela Editora Máquina de Escrever. Atualmente é Professora de História efetiva na Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso, colunista do Jornal Ucraniano Pracia - Праця e colaboradora do Blog Exílio-migração política.

 

FERRO, M. Cómo se cuenta la história a los niños en el mundo entero. México: Fondo de Cultura Econômica, 1990. [Livro]

FIGES, O. Uma história cultural da Rússia. Tradução de Maria Beatriz de Medina. Rio de Janeiro: Record, 2017. [Livro]

MASON, C. Uma breve história da Ásia. Tradução de Caesar Souza. Rio de Janeiro: Vozes, 2017. [Livro]

SEGRILLO, A. Os Russos. São Paulo: Contexto, 2012. [Livro]

19 comentários:

  1. Olá, Talita. Parabéns pelo texto.
    Ao longo da leitura, em especial por conta das citações do Gogol e do Shevchenko, fiquei com uma questão: eles – e ao que tudo indica muitos outros – falavam em "espírito dos tártaros", "abandono asiático", o que sugere uma compreensão de que existiriam características "essencialmente asiáticas" contrastantes com as europeias.
    Como tu pensas isso na tua análise, em especial em relação com o conceito de orientalismo? Tu enxergas essas reflexões nas obras trazidas, como a do Orlando Figes?
    Abraço,
    Nykollas Gabryel Oroczko Nunes

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    1. Olá, Nykollas!
      Obrigada pelo interesse na temática e pela leitura do meu texto!
      Vou começar pela última pergunta. Vejo que essa obra que utilizei do Orlando Figes traz um comparativo entre os aspectos que ele (ou os russos consideram) considera mais europeus frente aos mais orientais. Em muitas passagens ele dialoga sobre hábitos culturais tão enraizados que os considera genuinamente europeus/russos e em outros enaltece que existem alguns/muitos que certamente vieram do contato com o mundo oriental. Num dos capítulos, inclusive, afirma que durante os séculos XIX e XX, enquanto alguns artistas ocidentais renomados buscavam uma inspiração mais pura e genuína para seus trabalhos, uma fonte que realmente representasse as origens de um povo e sua cultura, eles precisavam viajar através de continentes para tal empreita. Os artistas russos, entretanto, necessitavam apenas “olhar para o próprio quintal” para encontrar elementos, por exemplo, selvagens e primitivos como ele afirma, para criar obras abstratas que compreendiam um frescor e importância extraordinários consolidados nos trabalhos de Malevich e Kandinski, Chagall, Goncharova, Larionov e Burliuk (não conheço a maioria deles, mas são chamados de primitivistas russos). Eles tiraram, segundo o mesmo autor, a arte russa das garras da Europa ao demonstrar o “barbarismo” (expressão dele) das estepes asiáticas.
      Em relação a primeira pergunta, imagino que existia um imaginário russo sobre a cultura asiática, um envolvimento místico que pairava sobre ela no que tange a construção de um conceito de orientalismo. Imagino que só pelo fato de que discutiam quais das suas raízes provinham dos orientais já demonstra que havia um apreço por ela, pois ainda que muitos teóricos do período não aceitassem tal influência, tantos outros viram algo de destaque, uma singularidade que só cabia aos russos – europeus ou asiáticos, ou ainda eurasianos – que outros povos não dispunham.
      Obrigada. =)
      Talita Seniuk

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  2. A Rússia possui um vasto território que está localizado entre a Ásia e a Europa, nesse sentido a grande quantidade de etnias presente no seu território, poderia levar a uma disputa por território ocasionada por um choque de culturas em especial pelos grupos religiosos como os mulçumanos e cristões ortodoxos, que poderia resultar no surgimento de um novo país ?

    Carlos Eduardo Ferreira Alves

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    1. Olá, Carlos!
      Obrigada pelo interesse no meu texto!
      Na Rússia, apesar do Estado se considerar laico, há uma predominância do Cristianismo Ortodoxo e favorecimentos em relação a ele (Putin sempre participa de reuniões com estes dirigentes religiosos). Não existe uma perseguição religiosa declarada contra as demais vertentes, entretanto, é sabido que o governo só usa da diplomacia com elas, quando estritamente necessário. Imagino que a criação de um novo país condicionada apenas a referenciais religiosos seja bastante difícil, até porque os russos usam seu poderio militar com maestria quando existem interesses em jogo. Mas a região mais ao sul do seu território e que extrapola seus limites tem passado por convulsões que todo o mundo assiste temeroso.
      Obrigada! =)
      Talita Seniuk

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  3. Oiii. Agradecida pela oportunidade.
    "As raízes da Rússia na vizinha Ucrânia". Como manter viva as tradições culturais e boas relações diplomáticas frente à crescente "anti Rússia" liderada por Vladimir Putin?
    Celimara Solange da Silva Orlando Curbelo.

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    1. Olá, Celimara.
      Eu que agradeço seu interesse no meu texto!
      Então, que pergunta difícil de responder! Ucrânia e Rússia há milênios possuem conflitos de interesses que na maioria dos séculos prejudicou os ucranianos e favoreceu aos russos. As tradições culturais em diversos momentos possuem nuances de proximidade entre as duas, por dividirem o mesmo segmento “eslavo”, como se percebe no uso do alfabeto cirílico, de alimentos típicos, dos bordados, das danças; entretanto, todos estes elementos abarcam algumas diferenças que para olhos menos avisados passam despercebidas, a exemplo, o alfabeto. Não obstante as duas usarem o cirílico, existem caracteres específicos em cada nação e nesse sentido, gosto de falar da letra “gué” (que tem o som do nosso G) que está presente no ucraniano mas não está no russo e durante o domínio soviético (que sabemos, quem detinha o poder eram os russos sobre todos os demais países satélites) ela foi proibida de ser usada, favorecendo o processo de “russificação” que aniquilou e ainda perdura infelizmente entre os ucranianos. Muitas palavras deixaram de usá-las e tiveram outra para substituí-la, claro, uma que pertencia ao alfabeto cirílico russo; os imigrantes ucranianos que vieram para o Brasil antes do período soviético continuaram a usá-la, os que ficaram lá, tiveram que se adaptar e na contemporaneidade tem sido feito um resgate dela entre os ucranianos que vivem na Europa.
      Eu considero a postura do presidente russo bastante desrespeitosa e incisiva perante a Ucrânia e até fico estupefata com o fato de que a ONU poderia muitas vezes ter interferido em algumas situações, mas preferiu se omitir. E também tenho ciência de muitos ucranianos étnicos que são a favor dessa política invasiva do Putin e desmerecem seu país, como no caso da invasão da Crimeia e da Guerra no Donbass que ainda persiste e divide não só a população afetada diretamente, mas ucranianos de outras regiões da Ucrânia. O que posso te afirmar, Celimara, que a comunidade de descendentes ucranianos no Brasil, que comemora seus 130 anos em 2021, assiste boquiaberta muitos destes fatos, adotando uma postura contrária a anexação da Crimeia pela Rússia e o conflito no Leste ucraniano.
      Obrigada. =)
      Talita Seniuk

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  4. Meus parabéns pelo seu trabalho, Talita. Foram muitas informações interessantíssimas. Minha pergunta teria a ver com a instrumentalização da herança oriental na projeção da política externa do governo Putin. Em que medida a construção de uma imagem não ocidental pode ser beneficiada ou limitada pelos processos que você trabalhou?
    Tenho outra curiosidade mais específica: há alguma influência cultural considerável que aproximaria a Rússia da China?

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    1. Olá, Gustavo!!
      Obrigada pelo interesse no meu texto!
      O presidente Vladimir Putin possui uma postura bastante singular enquanto líder de estado, há décadas lidera com uma política bem particular. Mesmo com diversas aberturas para o Ocidente, a Rússia ainda se vê (ou prefere que seja assim, talvez) como uma nação que não faz parte de um todo; essa imagem ora de aproximação ora de distanciamento ao passo que beneficia, também limita sua atuação. Devido a globalização, manter-se isolado é assinar a própria sentença de morte, então, Putin fecha acordos diplomáticos e comerciais quando considera necessário e não abre mão de algumas posturas. Entretanto, age de forma contrária em algumas situações, fazendo o oposto do que se espera de um chefe de estado em pleno século XXI (a anexação da Crimeia e a Guerra no Donbass são exemplos). Na questão étnica/cultural, essas atitudes podem servir de motivação para aquela população mais fanática/conservadora/fundamentalista/reacionária manter-se xenófoba e preconceituosa em relação a outros povos ou as suas próprias raízes. Imagino que talvez no Oeste os russos tenham orgulho de suas origens meio europeias meio asiáticas, mas no Leste fica mais evidente a manutenção de uma identidade mais próxima da europeia; essa imagem de soberania sobre as demais nações alimentada por Putin pode ser que esteja ocasionando problemas dentro do seu próprio espaço, por não reconhecer os elementos orientais que formam sua identidade nacional.
      Além de serem vizinhas, contemporaneamente a Rússia e a China estreitaram seus laços depois da dissolução da União Soviética, ligação essa que marca mais, pelo que sei, suas trocas comerciais por enquanto, apesar de haver disputas territoriais entre elas.
      Obrigada. =)
      Talita Seniuk

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  5. Minha pergunta é uma curiosidade na verdade, não sei se você saberia me responder: A boneca Matrioska teve influência do Japão em sua criação?

    Suelen Bonete de Carvalho

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    1. Olá, Suelen. Obrigada por ler meu texto e fazer questionamentos!
      A boneca matrioshka entrou para a cultura russa em 1891, segundo Figes quando a riquíssima família dos Mamontov encomendou para o artesão Maliutin uma boneca de encaixe baseada na versão japonesa. A primeira peça retratava uma menina camponesa em formato de barril com as bochechas coradas e uma galinha embaixo dos braços e assim seguia cada uma das menores, demonstrando outros aspectos rurais até chegar na menor delas, um bebê, como se estivesse enfaixado no estilo russo. Ao final da década, segundo o mesmo autor, já se havia produzido milhões delas de tanto sucesso que fizeram. Hoje são um símbolo da cultura russa, mas elas estão há pouco tempo representando esta etnia!
      Caso queira aprender mais sobre aspectos culturais da Rússia, sugiro a leitura de um dos livros que utilizei nas referências e nesta resposta: FIGES, O. Uma história cultural da Rússia. Tradução de Maria Beatriz de Medina. Rio de Janeiro: Record, 2017.
      O autor dele sugere para saber mais sobre os brinquedos russos essa obra aqui: W. Salmond, Arts and Crafts in Late Imperial Russia: Reviving the Kustar Art Industries, 1870–1917 (Cambridge, 1996).
      Obrigada. =)
      Talita Seniuk

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    2. Muito obrigada pela resposta!!
      Já vou atrás destes livros que você me indicou!!!
      Eu achei muito rico o teu texto, e me despertou um interesse maior no assunto!
      Obridada!
      Suelen Bonete de Carvalho

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    3. Oi, Suelen.
      Entra em contato comigo, por favor, se quiser trocar umas referências: talitaseniuk@gmail.com

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  6. Olá,Suelen.
    Resposta no comentário acima!
    Obrigada, Talita.

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  7. Parabenizo a autora Talita Seniuk, pelo trabalho cujo titulo é “a influência Oriental na cultura russa”, que aborda que a história da Rússia é marcada por ondas migratórias, guerras, invasões, anexações de territórios entre outros fatores que lhe afetam desde os primórdios da humanidade. Tudo isso a conferiu um status de melting-pot [local onde se derrete e funde o metal], emprestando o termo de Marc Ferro [1990], ao agrupar pessoas com diferentes modos de vida, culturas, religiões e grupos étnicos em oposição ao salad-bowl [tigela de salada, salada mista] do mesmo teórico, em que as culturas conservam suas identidades em separado. Como parte de seus limites terrestres permeiam dois continentes, as origens de seu povo também abarcam influências de ambos, como exemplo, muitas famílias russas tinham/tem ancestrais asiáticos, como dissera Napoleão Bonaparte certa vez: “Raspe um russo e encontrará um tártaro”. Assina Francielcio Silva da Costa.

    Quais as principais características da influência oriental na cultura russa?

    Quais são os principais teóricos estudiosos da cultura russa?

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    1. Olá, Francielcio!
      Obrigada pelo interesse no meu texto!
      As principais características da influência oriental na cultura russa estão presentes no vocabulário, nas expressões, na árvore genealógica de muitas famílias, nas superstições, nas comemorações, nos rituais, nos brinquedos, no artesanato, nas roupas, no modus operandi dos guerreiros cossacos, na culinária, no folclore; todos exemplificados brevemente durante o texto. Existem outros que por questões de espaço não cabem aqui devido a riqueza cultural desse povo que extrapola qualquer limite que se coloque.
      Entre os principais estudiosos da cultura russa, sugiro em primeiro a leitura de uma das obras que utilizei como referencial no artigo, Uma história cultural da Rússia de Orlando Figes, autor este que se dedica aos diferentes vieses dessa etnia, locomovendo-se com maestria entre os diferentes períodos históricos deste povo e nação e no mesmo volume indica uma vasta bibliografia a ser consultada. Entre outros temos Kandinski, Raeff, Reeder, Weiss, Ware, Venturi, Schmidt, Nicolson, Dixon, Hosking; mas infelizmente a maioria deles sequer foi traduzido para nosso idioma.
      Obrigada. =)
      Talita Seniuk

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