Renan Morim Pastor

 O PAPEL DA ESCRITA NO MÉTODO DE EVANGELIZAÇÃO JESUÍTA NA CHINA

 

Durante o século XVI, os contatos entre europeus e chineses se tornam mais frequentes, por meio de comerciantes portugueses que atingiram o território marítimo chinês procurando oportunidades de negócios. A concessão, por parte da China, do território de Macau em 1557 para que fosse usado como um porto permanente pelos lusitanos marca também a tentativa de penetração das missões religiosas no Império chinês, na década de 1560 [DIFFIE, WINIUS, 1977, pp.388-391]. Durante o período, franciscanos, dominicanos e jesuítas tentaram obter licença para divulgar sua fé no império da China. Dentre as ordens religiosas, os jesuítas foram os primeiros a conseguirem tal permissão, por intermédio das ações do Visitador Alessandro Valignano. O jesuíta concluiu que a penetração na China só seria possível a partir de um estudo da língua e da cultura chinesa, elaborando uma estratégia de acomodação cultural que permitiu aos jesuítas se comunicarem com os chineses em um nível muito mais elevado que os “rudes” portugueses, que eram considerados bárbaros pelos chineses.

Os jesuítas levaram este processo de acomodação para além do estudo da língua e da cultura, quando decidiram adotar as vestimentas e a aparência dos monges budistas. Os missionários procuravam uma forma de passar sua mensagem religiosa em termos que os chineses pudessem entender com mais facilidade, a partir de noções e conceitos teológicos que já fossem conhecidas por eles. Embora os jesuítas tenham impressionado os chineses o suficiente para conseguir residência, depois de uma década, Matteo Ricci decide mudar o método de acomodação cultural para afastar a imagem dos jesuítas do budismo e associa-la aos letrados chineses. O argumento de Ricci para esta proposta de mudança era de que o budismo chinês, embora possuísse muitos adeptos nas classes mais baixas da população, era completamente desprezado pelos mandarins (funcionários de Estado chineses, a maioria deles também letrados e seguidores de academias de pensamento confuciano) [BROCKEY, 2007, p.43].

Uma das características das escolas de pensamento letrado (ou ru, como eram conhecidos na China e mais tarde generalizado como confucionismo pelo mundo Ocidental) era a sua relação com a leitura e a escrita. Toda doutrina de Confúcio e outros filósofos estavam presentes em livros, que eram por sua vez comentados por outros filósofos ao longo dos séculos em suas próprias obras, criando assim uma cultura de comentários. Neste contexto os livros que os missionários passariam a publicar na China acabaram por se tornar uma importante ferramenta no método de evangelização jesuíta. Os missionários produziram uma série de livros e traduções em chinês de obras europeias e produções inéditas, com o intuito de atrair a atenção dos letrados chineses e apresentar-lhes a cultura, ciência, filosofia e a religião europeia. Os jesuítas também produziram várias obras destinadas ao público europeu, entre traduções e versões dos clássicos de Confúcio, como relatórios de viagens publicados em forma de livros que descreviam as características, curiosidades e mistérios da China para a Europa.

Os livros jesuítas também foram um importante mecanismo de defesa da missão e exaltação de seus métodos de acomodação perante a Europa, principalmente no que se relacionava à adoção das vestes e do estilo de vida dos letrados chineses pelos jesuítas, um passo defendido por Matteo Ricci e seus companheiros através de sua interpretação da filosofia confuciana, que na opinião do missionário seria complementar ao cristianismo, principalmente no que concerne seus preceitos morais. Divulgar o pensamento de Confúcio na Europa foi uma forma de demonstrar isso e tentar calar as críticas que os jesuítas sofriam dentro dos círculos religiosos.

Nosso objetivo aqui será destacar o papel dos livros e textos escritos na missão jesuíta na China, seja na forma de obras originais ou de traduções e adaptações linguísticas. Iremos abordar a produção textual jesuíta na China e seus temas, assim como destacar algumas obras importantes produzidas pelos missionários, tendo como alvo tanto o público chinês, quanto o europeu.

 

A produção textual jesuíta na China e seus temas

Durante o período da missão jesuíta na China, os jesuítas escreveram e publicaram cerca de 450 livros em chinês e um número desconhecido de obras derivadas do chinês para uma língua europeia (normalmente o latim, mas também português, espanhol, italiano e francês). Deste número de 450, 120 tinham como tema a ciência europeia, na forma de matemática, astronomia, tecnologia e geografia, muito utilizada para demonstrar os conhecimentos e a erudição dos missionários, atraindo a curiosidade dos chineses para depois, em futuras conversas, relacionar a ciência com a religião cristã. Os outros 330 livros tinham como foco a religião e a filosofia [BURKE, HSIA, 2007, pp.39-40].

Ainda trabalhando com este número total de 450, cerca de 50 destes eram traduções no sentido literal da palavra, onde os jesuítas copiavam e adaptavam linguisticamente os livros europeus sem muitas modificações, trabalhando com os caracteres chineses que fossem mais próximos das palavras originais. Todavia, por vezes os missionários traduziam os livros de uma forma mais adaptada, parafraseando, compilando, sumarizando e até mesmo modificando o sentido das frases, para que pudessem cativar, ou por vezes até mesmo possibilitar o entendimento, de seu leitor chinês. O mesmo também foi feito no processo de tradução do chinês para o latim, visando um público europeu. A maior parte dos temas abordados nos livros jesuítas tinham a ver com religião, humanismo e ciências. Os textos relacionados à religião incluíam rezas, textos litúrgicos (como missas), trabalhos teológicos, hagiografias, catecismos e textos devocionais. Os livros científicos tinham como assuntos a astronomia, geometria, aritmética, armas, anatomia, ótica e até mesmo falcoaria e musicologia. Por fim, os textos humanistas tinham como tema os clássicos da filosofia grega e romana. [BURKE, HSIA, 2007, pp.39-42].

Começando pelos textos de cunho religioso, alguns deles eram traduções utilizadas pelos missionários durante a manutenção de suas obrigações religiosas para com os cristãos chineses, como o Missale romanum, de 1670 e o Breviarium romanum de 1674, ambos traduzidos por Ludovico Buglio. Um dos motivos destes livros serem traduzidos para o chinês repousava no fato de que alguns missionários acreditavam que os chineses tinham muita dificuldade em aprender o latim e que a existência de textos na língua nativa diminuía o tempo e melhorava a qualidade da conversão. Um dos defensores desta ideia foi o próprio Buglio [BROCKEY, 2007, pp. 145-146]. Um outro tópico importante nas obras religiosas publicadas pelos jesuítas na China eram as hagiografias. Durante a missão da China, os jesuítas produziam textos que derivavam diretamente dos originais europeus, contando as vidas de importantes figuras como a Virgem Maria e José (que foi escolhido como Santo Patrono da China), Francisco de Borja e Francisco Xavier [BURKE, HSIA, 2007, p.41].

Com relação aos textos científicos, as traduções eram o tipo de trabalho mais comum. Os temas mais explorados eram astronomia e matemática, que receberam um foco maior de atenção na primeira geração das missões, da década de 1580 até 1620. Algumas das mais importantes traduções feitas no campo da ciência pelos jesuítas na China incluía o Euclides elementorum libri XV, Epitome arithmeticae practicae e o Geometria practica, todos do matemático Cristovão Clávio, traduzidos por Matteo Ricci com a ajuda dos chineses conversos Xu Guangqi e Li Zizhao [FONTANA, 2011, pp.213-214]. Além das obras de Clávio, foram traduzidos outros importantes tratados matemáticos da época, como o Le operazioni del compasso geometrico e militare, de Galileu Galilei por Giacomo Rho e Adam Schall e o Trigonometriae de Bartholomaeus Pitiscus por Johan Schreck. Além das traduções, os missionários também produziram obras científicas próprias, a maioria delas manuais e compilações para ensinar os chineses a matemática e astronomia europeia. Um exemplo deste tipo de livro foi o Ts’e tien yueh shuo (Teoria Abreviada Sobre as Medidas do Céu), escrito por Schreck em 1628, que tratava sobre astronomia, posicionamento orbital e instruções para o uso do telescópio [LACH, 1993, p.189].

Dos textos de cunho filosófico, as traduções jesuítas envolveram livros que eram parte do currículo humanista do Ratio Studiorum, o programa de estudos da Companhia de Jesus, que eram familiares a todos os jesuítas. O filósofo mais trabalhado pelos jesuítas na China foi Aristóteles, que teve traduzidos os textos: De coelo, Universa dialectica Aristotelis, Isagoge Porphrii, Categoriae e Analytica priora por Francisco Furtado, Alfonso Vagnone, Giulio Aleni e Francesco Sambiasi. Além destes textos na integra, o time de jesuítas também traduziu parcialmente o De coelo et mundo, Meteorologica, De anima, Parva naturalia e Ethica Nicomachea [BURKE, HSIA, 2007, p.43]. Matteo Ricci também foi responsável por algumas compilações adaptadas, como o seu famoso Jiaoyun lun (Da Amizade), o primeiro livro de Ricci escrito em chinês. A obra era composta por citações de vários autores clássicos que escreviam sobre a natureza da amizade, como Horácio, Cícero, Santo Agostinho, Aristóteles, Marcial, Erasmo de Roterdã, Sêneca e outros, que incluíam reflexões sobre afeto, afeição, solidariedade e compreensão. A compilação era baseada na obra Sententiae et exempla de Andrea Eborensis [SPENCE, 1989, p.157]. Na China Ming, a amizade era uma das relações mais valorizadas entre os homens, e o livro de Ricci fez um sucesso considerável, alavancando ainda mais a popularidade dos jesuítas.

O exemplo mais importante neste tipo de obra, escrita pelos jesuítas com seu público chinês em mente foi o Tianzhu Shiyi (Verdadeiro Significado do Lorde do Paraíso), a Magnum Opus de Ricci, produto de dez anos de estudos do missionário da língua chinesa e dos livros de Confúcio, além das observações e reflexões de Ricci sobre a cultura letrada chinesa. O livro foi a principal ferramenta de evangelização de Ricci, proposta como uma obra de estudo para não-cristãos e feita sob os conformes da acomodação cultural proposta pelo Visitador Valignano. O Tianzhu Shiyi começou a ser escrito durante os primeiros anos da década de 1590 e finalmente impresso em 1603. O livro também tinha o objetivo de substituir o primeiro catecismo produzido na China, por Michele Ruggieri, que se encontrava ultrapassado na época, pois recorria a terminologias budistas para explicar conceitos cristãos, não continha praticamente nenhuma menção sobre Confúcio e sua filosofia e ainda se referia aos jesuítas como “bonzos” (nome pelo qual eram chamados os monges budistas) do Oeste.

Embora o Tianzhu Shiyi seja considerado como um catecismo, sua estrutura textual era de um diálogo retórico, uma disputa argumentativa entre duas pessoas. Este tipo de recurso retórico era comum na China desde o período dos Reinos Combatentes e era conhecido como “persuasão” (shui) e foi a parte principal da formação da oratória chinesa clássica [JENSEN, 1997, p.97]. Na Europa, os jesuítas tinham familiaridade como este modelo de texto retórico e autores como Horácio, Virgílio, Cícero, Aristóteles e outros eram parte do currículo humanista dos colégios da Companhia de Jesus. Dessa forma, Ricci conseguiu encontrar um ponto em comum entre as culturas chinesa e europeia para basear sua obra.

O livro de Ricci tinha como objetivo principal o de convencer seu leitor chinês de que o cristianismo seria a única religião que complementaria os ensinamentos de Confúcio, antes que sua filosofia fosse contaminada pela chegada do budismo na China. Para chegar a este objetivo, Ricci centralizou o foco de seus argumentos em características que percebeu semelhantes entre a filosofia confuciana e o cristianismo, utilizando diversas citações dos clássicos chineses para demonstrar que muitos dos temas presentes nestes clássicos – como a fé em um único deus, a noção de recompensas e punições por parte do Paraíso, a existência da alma imortal – não eram novidade na China, pois teriam sido mencionados por todos os sábios antigos, principalmente por Confúcio, porém, a influência do budismo na sociedade chinesa teria feito com que essas práticas fossem modificadas ou esquecidas. Dessa forma, o cristianismo seria a chave para uma restauração dos ensinamentos de Confúcio [RULE, 1972, p.139].

 

Os escritos jesuítas para a Europa

Com relação às cartas, relatórios e livros escritos na China e enviados para a Europa, suas finalidades eram diversas. Obviamente a forma mais comum de comunicação entre os jesuítas e seus superiores eram as cartas. Em algumas delas, os missionários contavam a sua jornada pelos territórios da China, comentando sobre a cultura, religião, geografia, flora e fauna locais. Este tipo de carta costumava ser muito informativa e por vezes eram publicadas em forma de livros, com o objetivo não só de demonstrar o trabalho evangelizador da Companhia de Jesus, mas também de incentivar jovens missionários com a promessa de conhecer tais lugares exóticos enquanto faziam seu trabalho divino.

Dentro do âmbito privado, haviam correspondências endereçadas aos superiores jesuítas, mas diferente das primeiras, estas eram seladas e continham informações que não deveriam ser divulgadas para o público. Nestas cartas, os jesuítas contavam das dificuldades que enfrentavam em território estrangeiro, os problemas financeiros que atrapalhavam seus planos e até mesmo as reclamações sobre outros jesuítas ou referentes as autoridades portuguesas em Macau. Estas comunicações mais delicadas eram chamadas de hijuelas, e por vezes eram enviados junto de outros relatórios e cartas mais amenas, mas em folha separada e selada, para que fosse lida apenas pelo Superior a qual fosse endereçada [EISENBERG, 2000, p.51].

Haviam também as cartas edificantes, embora seu conteúdo e formatação lembrasse mais um relatório. Estas cartas tinham como foco as conquistas espirituais dos jesuítas, descrevendo o trabalho missionário de maneira favorável e virtuosa, empregando apelos emocionais ligados a necessidade de terem mais missionários em campo para ajudar as almas gentias, os milagres divinos que aconteciam na China, como as curas, exorcismos e conversões em campo e até mesmo o apelo emocional do martírio, onde os missionários contavam sobre as viagens marítimas e os perigos que enfrentavam para efetuar seu trabalho. As cartas edificantes eram lidas nos colégios jesuítas, durante o jantar, para a alegria daqueles que ainda estavam na Europa, ao ouvir notícias sobre seus amigos ao redor do mundo [EISENBERG, 2000, pp.540-55].

Existem muitos exemplos de coletâneas de cartas e relatórios que acabaram se transformando em longos livros, editados em narrativas completas e informativas e normalmente dedicados à realeza e a nobreza europeia e depois impressos em versões mais baratas, de circulação popular. Tais obras tinham o intuito de informar seu leitor sobre tudo que fosse possível sobre a China, além de contar a história da missão. Um dos mais famosos exemplos nesse caso foi a adaptação dos diários de Matteo Ricci por Nicolas Trigault, denominada de Chrstiana Expeditione apud Sinas, em 1621. A obra recebeu traduções em diversas línguas após a sua impressão, circulando na Europa em português, espanhol e inglês, contendo uma narrativa completa do período de missão de Ricci na China e das informações sobre o Império Ming. Também é preciso destacar, no âmbito destas obras, o Confúcio Sinarum Philosophus, obra editada por Phillipe Couplet, com o auxílio de Prospero Intorcetta, Christian Herdtrich e François de Rougemont, que consistia num compêndio contendo um misto de tradução e interpretação das obras do filósofo em latim. Importante destacar que Couplet e os outros jesuítas não traduziram simplesmente o texto original de Confúcio do chinês para o latim, mas escreveram eles mesmos a sua própria interpretação da obra, mantendo muito do corpo original do texto e acrescentando ou retirando palavras, sentenças ou notas de rodapé para melhor adequar os textos à sua própria interpretação da filosofia confuciana e de seu papel no método de evangelização escolhido pelos missionários. Ao examinarmos essa forma de “tradução” feita pelos jesuítas, é possível relaciona-la com ao termo espanhol “trasladar” que pode significar “interpretar” algum texto de uma língua para a outra e em outras vezes significa copiar, cortar, acrescentar, unir, reforçar ou enfraquecer o discurso original, além da possibilidade de mudanças nas metáforas e frases que não combinavam com o latim [CHARTIER, 2014, p.179]. No caso dos missionários, essas decisões também eram necessárias, não apenas para se adequar Confúcio na visão que os jesuítas tinham dele, mas para traduzir certos termos e estruturas culturais que seriam incompreensíveis para um europeu cristão. É por isso que vemos menções à vários personagens da literatura europeia no Confucius Sinarum Philosophus, como Dante e Achates, além de uma série de termos cristãos e bíblicos em momentos chave.

 

Conclusão

Ao passarem dos portões do Império, em sua busca por um estabelecimento na capital Pequim, os jesuítas se viram em uma sociedade com muitas ressalvas em relação aos estrangeiros e onde não se encontravam em uma posição social alta ou relevante. Para alcançar os chineses e ter alguma chance de êxito no processo de conversões, os jesuítas precisaram desenvolver um processo de acomodação à sociedade chinesa, mudando suas vestes, hábitos alimentares e aprendendo a língua nativa. Após anos de estudos e graças às ações principalmente de Valignano e Ricci, o método de acomodação adicionou uma outra característica importante para seu funcionamento: de passar a mensagem cristã a partir de termos familiares aos letrados chineses. Neste contexto, os livros tornaram-se uma importante ferramenta na abordagem evangelizadora dos jesuítas.

Naquela conjuntura, os jesuítas passaram então a produzir uma enorme quantidade de livros, sobre os mais diversos assuntos com o intuito de cativar a atenção dos chineses, tentando provar o nível avançado de cultura europeia. A escrita jesuíta tinha o papel de um intermediário, ligando a cultura europeia à chinesa e apresentando aos curiosos mandarins um novo mundo e principalmente, aproximando o confucionismo do cristianismo, como uma ponte. Mas essa ponte também ia pelo caminho contrário, e uma impressionante quantidade de livros e cartas foram escritas em latim, português, espanhol e italiano contando tudo sobre a China e sua cultura. Graças ao tipo de abordagem jesuíta, os livros exerceram um papel fundamental em promover o encontro entre dois mundos diferentes, trazendo os mistérios, costumes e progressos da cristandade na China para o curioso leitor europeu e mostrando as maravilhas científicas e o código moral europeu para os nobres letrados, e é possível analisar, por meio das palavras escritas pelos jesuítas, o encontro entre duas culturas tão distantes e com sociedades tão diferentes, de modo que podemos enxergar a produção literária jesuíta como uma ponte entre dois mundos.

 

Referências

Renan Morim Pastor, doutorando em história - UFRRJ. Bolsista CAPES. E-mail: renanp8989@gmail.com

 

BROCKEY, Liam Matthew. Journey to the East: The Jesuit Mission to China, 1579-1724. Cambridge, Mass.: Harvard University Press, 2007.

BURKE, Peter; HSIA, Ronnie Po-chia. Cultural Translation in Early Modern Europe. Cambridge, Cambridge University Press, 2007.

CHARTIER, Roger. A mão do autor e a mente do editor. São Paulo: Ed.UNESP, 2014.

DIFFIE, Bailey.; WINIUS, George D. Foundations of the Portuguese Empire 1415-1580. Minnesota: University of Minessota Press, 1977.

EISENBERG, José. As Missões Jesuíticas e o Pensamento Político Moderno: Encontros Culturais, Aventuras Teóricas. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2000.

FONTANA, Michela. Matteo Ricci: A Jesuit in the Ming Court. Maryland. Laham: Rowan & Littlefield Publishers, Inc., 2011.

JENSEN, Lionel M. Manufacturing Confucianism: Chinese Traditions & Universal Civilization. Durham: Duke University Press, 1997.

LACH, Donald F. Asia in the Making of Europe, Volume III: A Century of Advance. Book Two. Chicago/London. University of Chicago Press. 1993.

RULE, Paul A. K’ung Tzu or Confucius? The Jesuit Interpretation of Confucionism. 1972. 498f. Tese (Doutorado em Filosofia) Australian National University, Camberra. 1972.

SPENCE, Jonathan D. O palácio da memória de Matteo Ricci. A história de uma viagem: Da Europa da Contra-Reforma à China da Dinastia Ming. Trad.port. São Paulo: Companhia das Letras, 1989.

11 comentários:

  1. Caro Renan,
    parabéns por seu ótimo texto!
    Você poderia comentar o impacto e o o alcance dessas traduções [ou 'transcriações'] de Confúcio na Europa? Há um estudo sobre essa recepção?
    saudações,
    André Bueno

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá professor André! Eu fico muito agradecido pelo elogio e fico muito feliz de ter uma pergunta sua aqui.

      O Confucius Sinarum Philosophus foi bem recebido, pelo menos à princípio na Europa. Praticamente um ano depois da publicação da obra jesuíta na Europa, surgiram duas pequenas compilações, traduzindo trechos do trabalho jesuíta para o francês, a "Letter sur la Morale de Confucius, Philosophe de la Chine" em 1688 e "La Morale de Confucius, Philosophe de la Chine", e como o título sugere, ambos focam no aspecto moral da filosofia de Confúcio, embora os autores das duas compilações (Simon Foucher na primeira enquanto a segunda tem o autor desconhecido) também contemplam os aspectos religiosos interpretados pelos jesuítas, com o próprio Foucher afirmando que em Confúcio era possível ver resquícios da moralidade cristã e até mesmo um profeta que teria visto a chegada de Cristo. O Sinarum Philosophus também foi considerado o maior ponto de referência sobre a filosofia confuciana até pelo menos a publicação da tradução dos livros de Confúcio pelo James Legge, no século XIX. Na introdução que o Thierry Meynard faz da tradução trilingue do Lunyu (latim original, os manuscritos em chinês não publicados que ele teve acesso em Paris e a tradução em inglês que ele fez) ele comenta que o Sinarum Philosophus influenciou muitos filósofos da época, como Leibniz, Voltaire, Pierre Bayle e Georg Bilfinger, que inclusive escreveu um tratado sobre a moral e a política baseada na leitura jesuíta do Lunyu.

      Eu não conheço estudos que abordam essa recepção em detalhes. Em minha pesquisa eu já vi menções a essa recepção, como no Meynard, que citei anteriormente. Um capítulo do livro "The Great Encounter of China and the West 1500-1800" do D.E.Mungello aborda essa recepção, inclusive analisando os escritos do Leibniz, mas é apenas um capítulo (Capítulo 4 - "European Acceptance of Chinese Culture and Confucianism"). O capítulo 5 "Matters of Elinghtment" do livro "The Chan's Great Continent: China in Western Minds" do Jonathan Spence também aborda essa recepção, novamente pelo ponto de vista do Leibnez. Porém, eu pelo menos nunca encontrei nenhuma pesquisa que se dedicasse a essa recepção como foco central, apenas como parte de uma pesquisa maior.

      Excluir
    2. Ótimas dicas Renan, agradecido! =)
      André

      Excluir
    3. Eu que agradeço a sua pergunta, Professor André! Se durante a minha pesquisa eu acabar cruzando com alguma referência sobre um estudo mais detalhado dessa recepção, eu enviarei para você!

      Excluir
  2. Boa tarde. Ótima análise, Renan.
    Você considera que os escritos dos jesuítas que eram traduções de textos científicos europeus tiveram influência marcante para o interesse dos chineses nas atividades dos padres? Há alguma evidência de que a famosa tradução de Ricci(realizada junto com seu amigo chinês)da matemática euclidiana repercutiu realmente na China?
    Obrigada!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Olá Professora Carmen. Fico muito agradecido com o elogio e com a pergunta!

      De certa forma, a ciência era um dos chamarizes dos jesuítas para que os chineses, principalmente os letrados, se interessassem em suas atividades. Os jesuítas recebiam em suas casas letrados interessados em ver os mapas, os prismas, os instrumentos científicos e até para aprender matemática e geometria. Durante esses períodos, os jesuítas lentamente iam inserindo conceitos e comentando mais sobre o cristianismo para eles. A matemática de fato era importante neste contexto, pois segundo os jesuítas, as operações matemáticas, o movimento dos planetas e dos corpos celestes, tudo isso estava ligado à influência do paraíso. Então, nesse contexto, os textos científicos realmente ajudavam a aguçar o interesse dos chineses nos missionários, mas nem sempre eram garantia de conversão. Alguns realmente apenas procuravam os jesuítas pela matemática ou astronomia, por exemplo. O Imperador Kangxi teve aulas de matemática com Ferdinand Verbiest durante sua infância, e embora fosse tolerante e até curioso com o cristianismo, também nunca passou do ponto da curiosidade religiosa, sendo muito mais interessado na ciência.
      Os textos científicos jesuítas, principalmente matemáticos, atraíram os chineses por serem uma nova forma de praticar a matemática. Como na China as operações ainda eram feitas com o auxílio de equipamentos similares ao ábaco, a arte de "calcular com o pincel" dos jesuítas era mais rápida e acabava por dar vantagens e um certo status ao letrado que conseguisse demonstra-la, segundo Michela Fontana. Existiam grandes matemáticos na China, na época de Ricci, porém a classe como um todo era muito isolada e havia grande dificuldade em se obter textos especializados, pois os clássicos matemáticos de outras Dinastias haviam desaparecido das bibliotecas. Isso também contribuiu para a fama dos jesuítas.

      Uma evidência da influência destes textos científicos na China é o fato da palavra "jihe", que apareceu no título do texto Jihe yuanben, uma compilação com os cinco volumes de "Elementos" de Euclides, (publicado por Ricci e Xu Guangqi) ser considerada como sinônimo com a palavra geometria na China até os dias atuais.

      Excluir
    2. Muito obrigada pela resposta detalhada. Interessante o que você relata sobre a palavra "jihe", eu não tinha prestado atenção nisso e é importante! Realmente o Ricci ter sido aluno do grande Clavius em Roma deve ter ajudado muito! Uma formação considerável.

      Excluir
    3. Eu que agradeço pela sua pergunta, professora Carmen. A influência do Clavius realmente foi muito sentida nessa primeira parte da missão. Suas obras foram traduzidas por Ricci e seus colegas chineses, o que fez dele o matemático mais importante para os jesuítas na China durante essa época, além de ter sido correspondente do Ricci em várias cartas durante o período, como relatou o Jonathan Spence. Infelizmente eu acho que as cartas de resposta do Clavius para o seu ex-aluno na China não sobreviveram ao tempo, deve ter sido um diálogo muito interessante.

      Excluir
  3. Olá, Renan.
    Fico muito feliz por poder acompanhar, mais uma vez, sua participação no evento. Você tem uma pesquisa interessantíssima e um método de execução extremamente louvável.

    Seu texto me desperta inúmeras curiosidades, mas gostaria de apresentar aqui um ponto acerca do recebimento dos escritos jesuítas por parte da população chinesa. Houve algum tipo de resistência política e religiosa por parte dos nativos para com publicações de uma outra cultura e outra religião? E fica comprovado que a escrita tenha sido o método mais eficaz de conversão e acomodação ou outras estratégias eram executadas de uma melhor maneira?

    Desde já, muito obrigado!

    Abraços,
    Carlos Aldlen Torres de Souza.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Carlos, meu amigo, eu agradeço muito aos elogios. Também fico muito feliz de ver você aqui mais uma vez esse ano.

      Existia resistência sim. Tanto de letrados ortodoxos, que eram contrários a qualquer religião estrangeira (incluindo o budismo), tanto os budistas consideravam que os jesuítas "corrompiam" a filosofia de Confúcio ao completa-la com a sua própria religião. Todavia, havia mais uma resistência aos jesuítas em si do que ao ato de publicar os livros.

      Sobre os métodos, a escrita era um dos muitos métodos. No fundo, a estratégia jesuíta de conversão na China era uma junção de muitos métodos. Aliança com o confucionismo, publicação de livros, participação social na vida letrada chinesa, combate ao budismo e os próprios atos de acomodação e estudo da língua e da cultura. Então nesse caso, a publicação dos livros era uma engrenagem pequena em um "maquinário" muito maior, que era o processo de conversão dos chineses, principalmente dos letrados.

      Excluir

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.