André Felipe Costa da Luz

 A POLÍTICA DE TRÊS REVOLUÇÕES E A CONSTRUÇÃO DO SOCIALISMO NA REPÚBLICA POPULAR DEMOCRÁTICA DA COREIA


Introdução

Desde o ano de 1948, quando fundada a República Popular Democrática da Coreia, os coreanos têm levado adiante a construção do socialismo, um socialismo denominado “juche” (termo que, em tradução livre, significaria algo como “dono do próprio corpo”), baseado em uma cosmovisão própria e bastante peculiar ao seu desenvolvimento histórico, com raízes que remontam ao processo de libertação nacional liderado pelos comunistas contra o imperialismo japonês, responsável por colonizar a Península Coreana entre 1910 e 1945.

Independe do juízo do valor que se faça a respeito do regime instaurado na porção norte da Península, não é difícil reconhecer que essa experiência é alvo constante das mais diversas caricaturas e distorções possíveis por parte dos veículos internacionais de mídia. Muitas vezes, mesmo o trato acadêmico conferido ao assunto acaba por cair em semelhante conduta, terminando por conceber a construção do socialismo na RPDC como algo de fácil explicação, geralmente recorrendo ao apelo de que a China é responsável por financiar esse processo.

Muito longe de tentar esgotar a discussão, esse artigo, com o objetivo de melhor entender o desenvolvimento social e econômico da RPDC, se debruça sobre aquilo que vamos chamar de “Política de Três Revoluções”, com o objetivo de entender no que consistiu tal bandeira e quais as suas funções para a construção do socialismo juche na República Democrática Popular da Coreia.


A concepção da Política de Três Revoluções

Os intelectuais da RPDC, naturalmente, se debruçaram com afinco sobre as questões próprias da edificação do socialismo, principalmente a respeito da questão da luta de classes durante essa etapa do desenvolvimento das forças produtivas. Um dos principais fatores que diferencia a abordagem coreana da de outras experiência socialistas é a ênfase sobre a ideia de que as contradições sociais e econômicas não estariam findadas uma vez tendo sido vitoriosa a revolução socialista. Segundo Kim Kang Il:

 

“A revolução é a luta para realizar a independência das massas, algo que não se atinge depois do processo socialista, já que seguem de pé as velhas formas de pensar, as atrasadas forças produtivas e técnicas e o baixo nível cultural e intelectual que restringe e oprime a soberania dessas. Esses atrasos somente podem ser eliminados por meio da revolução que, portanto, deve prosseguir no que diz respeito aos aspectos ideológico, técnico e cultural, até o fim da etapa socialista” [Il, 1992, p. 76, tradução nossa].

 

A Política de Três Revoluções é concebida, portanto, não como uma mera abstração por parte de um grupo de teóricos, mas como uma exigência material do próprio transcurso da revolução. Corroborando com essa perspectiva, Kim Il Sung, principal líder do processo nacional-libertador e fundador da RPDC, assinala que:


“Com o estabelecimento do regime socialista se realiza o zazusong sócio-político das massas do povo trabalhador, mas fica, contudo, a tarefa de libertá-las completamente dos grilhões das velhas ideologias e da natureza. Portanto, depois da implantação do regime socialista, é necessário, juntamente com a sua consolidação e desenvolvimento ininterruptos, acelerar a escala total a transformação do homem e a natureza mediante o enérgico desenvolvimento das três revoluções para realizar por completo o zazusong das massas do povo trabalhador em todas as esferas. O Governo da República estabeleceu e vem materializando constantemente a orientação de executar as três revoluções: ideológica, técnica e cultural, desde o momento em que iniciou o caminho da construção da nova sociedade. Depois do triunfo da revolução socialista, o Governo da República desenvolveu vigorosamente as três revoluções, definindo-as como o conteúdo principal da revolução na sociedade socialista, como tarefas da revolução contínua até a construção do comunismo” [Sung, 2018, p. 32-33].

 

É possível notar que Kim Il Sung admite que o triunfo da revolução e a construção do socialismo por si só já presta uma valorosa contribuição no sentido da realização da independência (que ele vai conceituar como “zazusong”) das massas populares, porém, esse ainda é um processo de caráter inconcluso e, portanto, surge daí a ideia das Três Revoluções – ideológica, técnica e cultural – enquanto um processos de caráter imprescindível para edificar o socialismo e assegurar uma futura transição bem-sucedida para o estágio comunista.

 

Revolução Ideológica

Kim Il Sung estabelece que:

“Das três revoluções a ideológica é a mais importante. A revolução ideológica é a tarefa de transformar o homem para converter os trabalhadores em revolucionários comunistas por meio de sua revolucionarização e proletarização, também é o trabalho político dedicado a elevar seu entusiasmo revolucionário e iniciativa criadora. Na orientação da luta revolucionária e do trabalho de construção o Governo da República considerou a revolução ideológica como a mais importante tarefa e manteve consequentemente o princípio de priorizá-la ante os demais trabalhos” [Ibidem, p. 33].


Para compreender tamanho grau de priorização destinado ao processo de revolução ideológica se faz necessário recapitular algumas características do processo de dominação imperialista do qual os coreanos foram alvos durante 35 anos. Por mais de três décadas, a colonização japonesa impôs um ferrenho processo de “niponização” sobre os coreanos. Tal processo contribuiu para reforçar, no seio da sociedade coreana, perspectivas ideológicas vistas como profundamente atrasadas pelos comunistas coreanos. Kim Han Gil explica que:

 

“Os ocupantes japoneses aplicaram uma política de erradicação da cultura coreana. Eles não apenas embargaram o desenvolvimento da cultura nacional coreana em todos os aspectos, mas também destruíram e saquearam de forma imprudente a inestimável herança cultural. Eles, de forma ilegal, desenterraram tumbas antigas e reais em Pyongyang, Kaesong, Kyongju e de outros lugares para levar embora várias relíquias e preciosas peças de metal, além de saquear e danificar dezenas de milhares de volumes preservados em diferentes lugares. Eles chegaram ao ponto de distorcer a história coreana em benefício de seu controle colonial [Gil, 1979, p. 11].


O socialismo juche, por sua vez, não se limitando ao materialismo histórico-dialético marxista, ancora seus princípios a partir de um novo pressuposto filosófico, uma cosmovisão antropocêntrica que compreende o homem como “dono do mundo” e aquele responsável por seu destino, uma vez de que o mesmo, nutrido de independência, espirito criador e consciência, constituiria o ser mais poderoso do mundo e, por sua vez, seria aquele responsável por empreender as mudanças em seu curso, forjando seu próprio destino e rompendo com as relações de submissão impostas. Portanto, por partir de pressupostos fortemente ancorados na ideia da transformação da realidade a partir da atividade consciente do homem, os teóricos e dirigentes coreanos entendem que não é possível construir o socialismo sem que a consciência das massas populares não passe por um radical processo de transformação, daí a ênfase e prioridade dispensada em relação ao esforço da Revolução Ideológica que possibilitasse a superação das mazelas anteriormente mencionadas. Nesse sentido, Kim Il Sung reforça que:

 

“Desenvolver sem cessar a revolução ideológica é uma exigência legítima do desenvolvimento da revolução. Se não a intensifica continuamente na sociedade socialista, é possível que na mente das pessoas revivam ideias caducas e penetrem as ideias capitalistas difundidas pelos imperialistas. Ademais, se não seguem a revolução ideológica, é provável que decaia paulatinamente o fervor revolucionário dos homens a medida em que melhora a vida e desaparecem as preocupações pelo alimento, vestuário e moradia. Apenas ao fortalecer constantemente a revolução ideológica se poderá levar a cabo com êxito o difícil, mas fundamental trabalho da educação e transformação comunista das pessoas e imprimir uma constante ascensão da revolução e da construção.” [Sung, 2018, p. 35]

 

Revolução Técnica

A Revolução Técnica constitui outro ponto crucial para a construção do socialismo, tendo em vista que este é um estágio de desenvolvimento durante o qual as forças produtivas precisam ser potencializadas no sentido de conseguir prover as demandas próprias do planejamento econômico central, sendo a industrialização algo de suma importância também para abolir a divisão do trabalho, ou seja, a diferença entre trabalho intelectual e trabalho manual, possibilitando um maior grau de igualdade entre os trabalhadores.

O imperialismo japonês, durante os 35 anos em que colonizou a Coreia, adotou uma política econômica através da qual foi fomentada a atividade industrial, porém, os coreanos jamais colheram os frutos desse desenvolvimento, tendo em vista que a indústria instalada pelos japoneses tinha o objetivo de maximizar os lucros da metrópole, intensificando ainda mais a atividade imperialista caracterizada pela importação do excedente de capital e importação de matéria prima. Para Visentini:

“Em termos econômicos, houve crescimento significativo, por vezes até maior do que o do próprio Japão, ainda que desigualmente distribuído. A produção agrícola expandiu-se substancialmente na década de 1920, graças a técnicas de irrigação implementadas pelos colonizadores, que visavam ao incremento da produção de arroz. Seguiu-se uma industrialização protegida nos anos 1930, voltada sobretudo para a indústria pesada no norte, cujo objetivo era fornecer bens de capital para a indústria de defesa japonesa no esforço de guerra contra a China. A parcela representada pela indústria na produção total da Coreia cresceu, aproximadamente, de 17% em 1925, para 395 em 1939. Destacam-se, em particular, o notável crescimento das indústrias química e metalúrgica e de máquinas/ferramentas, as quais, em conjunto, representavam cerca de 47% de toda a produção industrial da Coreia. Esse desenvolvimento econômico, no entanto, tinha como destino final a metrópole e trazia escassos benefícios para a população coreana. Para ilustrar essa situação, cabe lembrar que, graças à modernização promovida pelos japoneses, a produção de arroz norte-coreano aumentou em quase 40% entre 1912 e 1936; porém, no mesmo período, a quantidade de arroz consumida por coreanos diminuiu consideravelmente, de cerca de 70% para cerca de 40%. O resto da colheita era exportado compulsoriamente para o Japão, o que gerava aguda escassez alimentar na Coreia” [Visentini; Pereira; Melchionna, 2015, p. 39].

Como podemos ver, durante a colonização japonesa, a Coreia se encontrou em uma paradoxal situação na qual, ainda que presenciando o crescimento da atividade industrial, viu o desenvolvimento de suas forças produtivas ser atrasado pelo jugo imperialista. Sobre a necessidade da revolução técnica, Kim Il Sung afirma que:


“A revolução técnica é uma importante parte integrante das três revoluções. Este constitui uma sagrada tarefa revolucionária endereçada a fomentar sem interrupção o bem-estar material do povo e libertar os trabalhadores de labores penosos, desenvolvendo as forças produtivas. Somente alcançando-a pode-se constituir a economia nacinal independente socialista, emancipar os trabalhadores das duras tarefas e assegurar-lhes uma laboral independente e criadora. [...] Com o enérgico desenvolvimento da revolução técnica conseguimos, em um curto espaço de tempo depois da libertação, superar totalmente a unilateralidade colonial da economia e o atraso técnico deixados pelo imperialismo japonês, e depois efetuamos a reconstrução técnica global da economia nacional e cumprimos de modo brilhante a histórica tarefa da industrialização socialista.” [Sung, 2018, p. 35-36]

Para os comunistas coreanos, não se pode edificar o socialismo sem a independência, e a independência, por sua vez, tem como requisito primordial uma economia autossuficiente e autárquica, o que Kim Il Sung demonstra através de alguns números:


“[...] No ano passado, a produção industrial cresceu 196 vezes em comparação com 1946, e nos anos 1946-1977 o setor da indústria mecânica aumentou de 5,1 a 33,7% no valor total da produção industrial. Nosso país cobre com a produção nacional 98% das necessidades de máquinas e equipamentos e se integrou às fileiras dos países desenvolvidos na produção per capita de artigos industriais” [Ibidem, p. 36-37].

 

Revolução Cultural

Ao se deparar com tal termo, é quase que automática a ligação que possamos querer traçar com a Grande Revolução Cultural Proletária levada adiante por parte dos chineses, porém, cabe ressaltar que, apesar do título, a Revolução Cultural empreendida pelos comunistas coreanos constitui um processo de natureza distinta.

Durante as mais de três décadas de colonização japonesa, o grau de instrução do povo coreano sofreu uma drástica queda. Totalmente desprovidos de direitos, o povo coreano foi convertido em uma massa de ignorantes em seu próprio solo, acarretando em um intenso aumento no número de analfabetos. A educação formal de qualidade passou a ser uma exclusividade das elites que colaboravam com o imperialismo nipônico. É para combater essa mazela que se destina a revolução cultural promovida na RPDC. Segundo Kim Il Sung:


“A revolução cultural é outra das três revoluções, que há de cumprir o Estado da classe operária. Somente com a execução desta revolução é factível eliminar o atraso cultural, herdado da velha sociedade, e criar uma cultura socialista e comunista, assim como transformar todos os membros da sociedade em homens comunistas, desenvolvidos em diversas facetas. [...] Em nosso país, o trabalho docente registrou progresso bastante rápido. Segundo o avanço da revolução e da construção foi implantado de maneira gradual o ensino obrigatório, e hoje está em vigência o ensino obrigatório geral de 11 anos, que oferece a todos os integrantes da jovem geração o ensino secundário geral completo. Agora, 8.6 milhões de adolescentes e crianças, que são mais da metade da população, estudam gratuitamente, custeado pelo Estado, e se formam como tesouros revolucionários comunistas. [...] A revolução cultural em nosso país, que começou pela campanha alfabetizadora depois da libertação, avançou longe sob a bandeira da República, e está hoje em uma etapa tão alta que coloca como tarefa a implantação do ensino obrigatório superior. Esta é uma das façanhas mais valiosas realizadas por nossa República na construção de uma nova sociedade e um grande orgulho para nosso povo. Hoje, a tarefa mais importante da revolução cultural consiste em acelerar a intelectualização de toda a sociedade.” [Ibidem, p. 40-41]

Como podemos constatar, o sentido central da revolução cultural promovida na RPDC consiste em transformar os cidadãos coreanos em sujeitos literalmente dotados de cultura, entendendo que a qualificação do ser humano é também um requisito indispensável na tarefa de construção de uma sociedade socialista, dotada de valores superiores.

 

Conclusão

Após esse breve exame acerca das três revoluções empreendidas pelo governo da RPDC, é possível concluir que, longe de serem processos isolados, cada uma dessas transformações atua de forma complementar, revolucionando os três setores de forma simultânea e complementar uns aos outros.

Uma vez libertos do imperialismo japonês, os comunistas coreanos, liderados por Kim Il Sung, compreenderam que a revolução estava longe de acabar e que, muito pelo contrário, só poderia se ver completa uma vez superados todos os profundos resquícios oriundos de quase 40 anos de intensa dominação. 

Portanto, é possível afirmar que a Política de Três Revoluções consiste em um ponto chave para a construção do socialismo, compreendidas como o caminho para revolucionar a sociedade no sentido de edificar uma nação dona de seu próprio destino.

 

Referências

André Felipe Costa da Luz é graduando em História pela Universidade Estadual do Ceará – UECE, integrante do Laboratório de Estudos e Pesquisas Orientais – LEPO e membro fundador do Grupo de Estudos Coreanos – ARIRANG, ambos pertencentes ao Centro de Humanidades da UECE.

 

GIL, Kim Han. Modern history of Korea. Pyongyang: Foreign Languages Publishing House, 1979.

Il, Kim Kang. Dirigente Kim Zong Il. Pyongyang: Ediciones em Lenguas Extranjeras, 1992.

SUNG, Kim Il. RPDC e o socialismo juche. São Paulo: Edições Nova Cultura, 2018.

VISENTINI, Paulo G. Fagundes; PEREIRA, Analúcia Danilevics; MELCHIONNA, Helena Hoppen. A Revolução Coreana: o desconhecido socialismo Zuche. São Paulo: UNESP, 2015.

7 comentários:

  1. Olá André!

    De que forma a "Política das Três Revoluções" está presente hoje no governo de Kim Jong-un?

    Aproveitando o ensejo, em setembro último a UNICEF informou que Jong-un rejeitara uma oferta de 3 milhões de doses de vacinas contra a covid-19. Tal fato seria um exemplo prático da verve "edificar uma nação dona de seu próprio destino"?

    Grato pela atenção.

    Saudações!

    Willian Spengler

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    1. Boa noite, Willian! Grato pela pergunta!

      Bem, após um exame do desenvolvimento recente da República Popular Democrática da Coreia, o governo de Kim Jong Un tem reunido esforços notáveis no sentido de manter a ampliar a Política de Três Revoluções.

      A Revolução Ideológica segue pulsante, por exemplo. Os valores socialistas continuam sendo estimulados, principalmente entre as gerações mais jovens. A propaganda oficial do regime é sempre bastante enfática ao vincular textos, músicas e filmes que ressaltam a importância de não se deixar envenenar por aquilo que eles enxergam como sendo sintomático do estilo de vida capitalista ocidental.

      No caso da Revolução Técnica, a mesma se manifesta a partir da edificação de novos complexos industriais (algo notável para um país sufocado pela mais pesada carga de sanções econômicas) e, principalmente, a partir das novas gigantescas edificações que têm transformado a paisagem das principais cidades do país.

      A Revolução Cultural, por sua vez, segue sendo levada adiante a partir do intenso incremento do ensino 100% público. Podemos destacar alguns feitos notáveis no caso do ensino superior, como a Universidade de Ciência e Tecnologia de Pyongyang (instituição famosa por contar com diversos professores estrangeiros em seu quadro docente, servindo também como uma ponte para o intercâmbio acadêmico, diplomático e cultural) e o Complexo Técnico-Cietífico de Pyongyang.

      Sobre a questão das vacinas, a UNICEF informa que a justificativa apresentada pelo governo da RPDC seria a de que, uma vez que o país não contra com casos de COVID, as doses oferecidas poderiam ser remanejadas de forma prioritária para países que enfrentam situações piores em relação ao vírus, diante do atual quadro de escassez de imunizantes. De fato, a RPDC foi o primeiro país a implementar uma rígida fronteira e fechamento de fronteira, algo que, segundo o regime, teria possibilitado manter o país intacto em relação ao contágio.

      Confesso que não sei se, para além da justificativa anteriormente mencionada, existiria um pano de fundo motivado por um afirmação de independência, porém, tomando como exemplo outros momentos da história da Penínsua, é algo que pode fazer sentido. Para os coreano do norte é, de fato, preferível desenvolver o próprio imunizante (ainda que leve mais tempo) do que depender da ajuda de instituições estrangeiras.

      Espero ter conseguido contemplar tuas questões, Willian. Caso necessário, não hesite em perguntar novamente.

      Abraço!

      Att,

      André Felipe Costa da Luz

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  2. Bpm dia. Belo trabalho. E nessas 3 revoluções como fica a relação com os outros países socialistas como a China? OU a Coréia pensa em um caminho ao socialismo solitário? Grato Marlon Barcelos Ferreira

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    1. Boa noite, Marlon! Boa pergunta!

      Costumo tentar resumir a política externa da RPDC a partir da ideia de um país que busca incessantemente a independência em relação aos inimigos, mas também no que diz respeito aos aliados. A Península Coreana é cercada por grandes potências, como Rússia, China e Japão. Para preservar a integridade de seu próprio território, adotou desde sempre uma política caracterizada pela reclusão, para que assim fosse possível preservar seu desenvolvimento enquanto povo, daí a Coreia ter ficado conhecida como "Reino Heremita".

      No caso específico da China, podemos dizer que coreanos e chineses possuem relações de proximidade que remetem aos períodos dinásticos, porém, não obstante a fraterna amizade (contando também com alguns períodos de animosidade) entre os dois povos, a Coreia nunca aceitou estar a reboque dos interesses chineses, mesmo após a proclamação da República Popular da China, em 1949. Um exemplo disso é a posição de neutralidade adotada pela RPDC após a ruptura sino-soviética, na década de 60. Ao invés de tomar partido pelo PCUS ou pelo PCCh, a Coreia Popular recusou o alinhamento automático e preferiu fomentar o Movimento dos Não-Alinhados, estabelecendo uma intensa parceria com os países do Terceiro Mundo, principalmente da África e Oriente Médio, prestando valorosa ajuda para os grupos que lideravam processos de libertação nacionais nessas regiões.

      É inegável que a China tem até hoje um papel de extrema importância enquanto aliado estratégico da Coreia Popular, porém, a RPDC não abre mão de sua total autonomia. Talvez a ideia de um "caminho ao socialismo solitário" não seja a mais adequada, mas definitivamente podemos falar de um caminho independente (inclusive perante aliados, como vimos), autárquico e autossuficiente.

      Espero ter me feito entender, Marlon. Em caso de dúvida, pode perguntar novamente, por favor.

      Abraço!

      Att,

      André Felipe Costa da Luz

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  3. Boa tarde, André. Excelente trabalho, parabéns. Sobre a Revolução ideológica, havia uma concepção da Coreia tornar-se comunista no futuro? Existem diferenças entre a visão de Kim Il Sung e Kim Jong Un em relação ao socialismo?

    Obrigada.

    Lorena Brasileiro Correia.

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    1. Boa noite, Lorena! Agradeço pela pergunta!

      Os trabalhos de intelectuais da Coreia Popular, incluindo os dos líderes Kim Il Sung e Kim Jong Il pontuavam a ideia de desenvolver o socialismo com vistas ao futuro comunista, porém, é importante salientar que, conforme o estabelecido pela teoria do socialismo científico, o comunismo é uma etapa de desenvolvimento das forças produtivas que somente se realizaria em termos mundiais. O futuro comunista seria, portanto, não apenas do povo coreano, mas da humanidade. De qualquer forma, é importante esclarecer que a RPDC removeu formalmente de sua constituição qualquer referência ao conceito de "comunismo" desde 2009.

      Acredito que as principais diferenças entre Kim Il Sung e Kim Jong Un sejam de cunho contextual. Kim Il Sung foi o líder responsável por liderar o processo de libertação nacional da península e edificar a construção socialista até 1994. Em termos teóricos, Kim Il Sung foi o criador da Ideia Juche, que para ele, de início, consistia na aplicação criativa do marxismo-leninismo a realidade coreana. Kim Jong Un, por sua vez, assumi a liderança do país em um período histórico distinto e, tratando de sua perspectiva em relação ao socialismo, ele foi responsável por estabelecer o Kimilsungismo-Kimjongilismo como ideia diretriz do Partido do Trbalho da Coreia, algo que não seria posível sem o trabalho anteriormente desempenhado por Kim Jong Il, ao sistematizar o Juche como uma ideia revolucionária original e não apenas como uma adaptação de teorias precedentes.

      Como podemos ver, o trabalho de uma liderança não pode ser concebida sem o da outra. Para além de diferenças, creio que é mais notável o elo de continuidade entre os três, algo muito característico da ideia de unidade monolítica preconizada pelo socialismo coreano.

      Espero ter contemplado os seus questionamentos.

      Abraço!

      Att,

      André Felipe Costa da Luz

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